Filho, não diz que é evangélico!

Evangélicos foram ativos nas manifestações neste domingo, 7 de setembro, feriado da Independência, para gritar por anistia a condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro e por crimes contra a democracia.

Na coluna desta semana, uma crônica para desanuviar.

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Primeiro dia de aula na nova escola. Logo entraria numa sala de aula em que só ele era o estranho. A meninada se conhecia desde o maternal e chegaram juntos ao nono ano.

No carro, eu e a mãe estávamos apreensivos. O Pedro, tranquilo, curioso e autoconfiante.

As escolas na pós-pandemia estavam estranhas. Energias represadas e puberdades afetadas pelo excesso de telas. Corpos com nítidos prejuízos nos movimentos e funcionamentos. As tais sequelas da Covid-19 que afetaram os adolescentes de forma tão peculiar.

Na travessia do túnel que une a zona norte a zona sul do Rio, sabíamos que as distâncias não eram apenas geográficas. O nosso menino estaria imerso numa cultura diferente. O período de adaptação nos assustava uma vez que ele sempre estudou na mesma escola, dos três aos treze anos.

O projeto pedagógico construtivista, com forte ênfase nas artes, nos atraia. Quanto a comunidade escolar, geográfica e culturalmente, tão distante, a princípio, nos assustava e intimidava.

Vencida a escuridão do túnel mal iluminado, chegamos ao charmoso bairro da zona sul.

Patrícia deu várias instruções como se partilhasse um quite de sobrevivência. Quando tenso, tendo ao silêncio. Contudo, na porta da escola, ainda dentro do carro, só fiz um pedido.

– Filho, nestes primeiros dias, não diga que você é evangélico, muito menos que seu pai é pastor.

Assentiu com a cabeça, mas, com os olhos disse outra coisa.

Minha preocupação consistia em imaginar que ele poderia ser hostilizado naquele ambiente libertário pelo fato de afirmar uma identidade socialmente construída como reacionária.

No nosso caso, nenhuma vergonha do Evangelho encarnado por Jesus de Nazaré, contudo, profundo constrangimento pela quadra histórica brasileira caracterizada como a fraquejada de um país terrivelmente evangélico.

Setores evangélicos foram fortemente responsáveis por conduzir rebanhos enormes para a lama: negacionismo científico, movimento antivacina que colocava em xeque a imunização do “rebanho”, igrejas como comitês eleitorais da extrema direita, elogios ao golpe de Estado, desprezo pela democracia, fotos de torturadores estampadas em camisas, guerra cultural transformada em guerra espiritual, demonização do outro e vocalização do discurso de ódio com léxico bíblico chulo.

Como agora meu filho se socializaria no pátio da escola dizendo-se filho de pastor?

Não pudemos evitar, abrimos a porta do carro e o deixamos ir.

A mãe foi com ele até o portão da escola. Mas, antes, ele se aproximou de mim e pela janela do carro disse baixinho:

– Relaxa, pai! Vai ficar tudo bem!

Ainda na primeira semana de aula, quando voltámos no túnel em direção a zona norte, suado por ter jogado futebol na quadra da escola, com a cara de quem estava de boa, o moleque falante disparou:

– Pai, geral sabe que você é pastor e que eu sou evangélico!

– Você contou?

– Na aula de história a professora pediu para nos apresentarmos. Daí pintou o assunto da religião. Eu sou o único evangélico da classe. Mas, foi tranquilo.

Apreensivo eu estava e preocupado fiquei.

Completado quase dois anos da transferência, o Pedro está super entrosado na nova escola. Fazendo novas descobertas, se responsabilizando pelas suas próprias escolhas, aprendendo conteúdos que cairão no vestibular daqui a dois anos e desvendando a arte da convivência que sempre aparecerá ao longo da vida.

Hoje (08) eu tive uma recaída quando ele saiu cedo de casa. Uma vergonha enorme. Evangélicos estiveram ontem em massa em manifestações em pleno dia 07 de setembro para defender anistia para os golpistas que vandalizaram a República, tentaram derrubar a democracia, planejaram assassinatos de autoridades, enfim, fizeram o diabo…

Em pleno domingo, entre o culto da manhã e o da noite, o discurso de ódio foi acionado na versão “boca suja” com slogans supostamente bíblicos para ungir como messias o líder da organização criminosa que arquitetou o golpe.

Não há no Brasil atual nenhum movimento de perseguição religiosa, nem no pátio da escola do meu filho, muito menos no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF).

Minha oração, nestes dias históricos em que os líderes da organização criminosa que arquitetaram o golpe serão julgados, que se faça justiça. Conheceremos a verdade, e a verdade nos libertará!

Sem anistia para falsos messias e falsos profetas de boca suja.

 

Valdemar Figueredo

Editor do Instituto Mosaico, professor universitário, pesquisador (pós-doc USP), cientista social e pastor

OPINIÃO
As ideias aqui apresentadas são de responsabilidade exclusiva de quem assina o texto, não correspondendo, necessariamente, ao posicionamento do Instituto Mosaico.

1 Comentário

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