Mas Livra-nos do Mal

Nesta quarentena, li com muito interesse um livro que tinha há alguns anos, mas nunca tinha aberto: Sobre a brevidade da vida, Sêneca. Sublinhei a seguinte frase: É preciso durante toda a vida aprender a viver e, o que talvez cause maior admiração, é preciso durante toda a vida aprender a morrer.[1]

Estamos lidando de perto com a morte. Sempre estivemos, mas em tempo de pandemia fica a sombra que o vírus pode nos alcançar e vitimar.

Daí, e se…

Talvez você tenha gastado algumas horas dessa quarentena imaginando o mundo sem a sua ilustre presença. Construções de cenários mentais em que na sua ausência a vida continua.

Quem perderia o quê com a sua morte?

Isso é assunto para muitos dias. Por hora basta refletir se não estamos vivendo errado.

Voltando a Sêneca, é preciso aprender a viver enquanto não aprendemos a morrer.

A pandemia do COVID-19 lembrou à humanidade a nossa finitude e o quanto tudo é breve.

Na oração do Pai Nosso, Jesus não ensina a suplicarmos por imortalidade, apenas nos incentiva a viver.

O medo de viver é o mesmo que perder precocemente a vida.

A vida é cheia de riscos, perigos e o mal está sempre perto.

Para Sêneca não devemos dizer que alguém viveu por longo tempo por causa dos cabelos brancos ou das rugas. Existir por muitos anos não é o mesmo que viver por muito tempo.

Temos sido instruídos a nos mantermos no distanciamento social e a observarmos novos hábitos de higiene, como lavar muitas vezes as mãos e usarmos máscaras protetoras. Tudo isso ameniza o perigo, mas não o elimina.

Isso serve como metáfora da própria vida. Podemos ser prudentes e vivermos vida decente, contudo, tais providências sensatas amenizam, mas não eliminam os perigos, muito menos afugenta o mal.

Passado o pandemônio da pandemia, teremos que voltar a nos arriscar no espaço aberto. Viver é correr riscos. Vamos precisar de coragem para sermos autênticos, como ensinou Jesus.

A propósito, no fim da vida, quando se despedia dos amigos por saber que sua hora era chegada, ele se afastou um pouco. O ponderado é aquele que recua um pouco para obter um ângulo melhor da cena social.

Num lugar quieto, estando a sós, Jesus intercedeu por seus discípulos que iriam continuar o que ele havia começado. Sua oração foi nesses termos: Pai, não peço que os tires do mundo, e sim que os guardes do mal (João 17.15).

Foram dez dias seguidos que nos encontramos aqui nesta sala virtual para conversar sobre a oração do Pai Nosso. Melhor do que falar sobre oração é orar. Neste sentido, quero orar por vocês que me acompanharam nesta série. Vamos fazer isso agora?

[1] SÊNECA. Sobre a brevidade da vida. Sobre a firmeza do sábio: Diálogos. São Paulo: Penguin Classics Companhia das Letras, 2017. p. 16

Valdemar Figueredo
Editor do Instituto Mosaico, Pesquisador da USP (pós-doc), cientista social e pastor
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