Em 7 de outubro de 2023, militantes do Hamas sequestraram cerca de 250 pessoas, mataram 838 civis e 327 soldados, o ataque representou a maior perda de vidas judaicas em um único dia desde o Holocausto. No ataque, não houve distinção entre civis e militares, ou, entre mulheres e homens, crianças, jovens ou idosos. O ataque chocou o mundo e recebeu o imediato repúdio de todos aqueles que estão comprometidos com um mundo pacífico e de respeito à autodeterminação de todos os povos.
Por outro lado, a resposta do governo israelense também foi sem precedentes. Enquanto este texto está sendo escrito, mais de 60 mil palestinos, também sem distinção entre civis, militantes, crianças, jovens, mulheres ou idosos, já foram mortos pelos ataques israelenses.
Curiosamente, boa parte das reportagens sobre os ataques israelenses não apresenta uma simples comparação dos números de mortes em ambos os lados. Talvez porque pareça frio demais. Todas as vidas importam e o ataque do Hamas causou indignação e horror ao redor do mundo tamanha foi a brutalidade e a crueldade com que aquelas pessoas foram mortas, feridas ou sequestradas. Por outro lado, até este momento, as forças israelenses já mataram cerca de 50 vezes mais pessoas. Então, deveríamos ter 50 vezes mais comentários na imprensa mundial, mais indignação e manifestações de repúdio. Mas, não é o que vemos.
O argumento em geral é o de que o que as forças israelenses estão fazendo é uma reação ao ataque de 7 de outubro e, portanto, tudo está justificado. Mas, o 7 de outubro precisa ser colocado sob perspectiva histórica e isto não anula, insistimos, nossa indignação com as ações da Hamas naquele dia. Mas, colocar o 7 de outubro sob perspectiva histórica é um argumento necessário e nos confronta com a questão acerca do valor que damos (ou não) às vidas palestinas.
Vale destacar ainda, que os ataques sionistas contra o povo palestino não se restringem ao tradicional uso de armas de destruição em massa, mas, também a fome tem sido usada como arma de guerra. Ao lado das restrições impostas contra a ajuda humanitária, privando o povo palestino de comida, água, remédios etc, outra estratégia genocida que deve ser destacada é a destruição sistemática, de hospitais, escolas e universidades e a morte de médicos, enfermeiros e professores, além da infraestrutura básica de saneamento e de prédios do governo e moradias.
Todas essas ações colocadas lado a lado funcionam como uma espécie de garrote em torno do “pescoço” do povo palestino, garrote que vai sendo apertado aos poucos com o objetivo do aniquilamento total de suas vítimas.
O Sionismo Cristão
O sionismo cristão é a crença segunda a qual o povo judeu tem direito divino ao território da ou, como eles preferem, à terra de Israel. Essa crença popularizou-se na Inglaterra novecentista tendo como fundamento a teoria escatológica pré-milenista dispensacionalista de John Nelson Darby.
Vale destacar que entre seus princípios havia a crença de que as promessas de Deus a Abraão de posse da terra de Canaã, conforme registradas no Antigo Testamento, permaneciam válidas. Essa promessa seIsrael, estendia aos seus descendentes identificados no moderno povo judeu. Em síntese, o dispensacionalismo prevê que Israel será restaurado em suas fronteiras bíblicas como preparação para a volta de Cristo.
O estabelecimento do Estado de Israel em 1948 foi visto por estes evangélicos como o cumprimento de profecias bíblicas que apontavam para a preparação da volta de Cristo. Mas, o divisor de águas, para que esses evangélicos passassem de observadores do cenário mundial, para atores politicamente engajados, parece ter sido a Guerra dos Seis Dias, em 1967, quando Israel assumiu o controle da Cisjordânia, Gaza e de toda a cidade de Jerusalém, contrariando as fronteiras estabelecidas pela Liga das Nações em 1948. Esses evangélicos enxergaram nesse acontecimento o início da contagem regressiva para a volta de Jesus.
Ao transformar a fé cristã em ideologia política, os sionistas cristãos ajudam a fomentar a instabilidade política na palestina e participam direta e indiretamente do genocídio do povo palestino.
Se há uma solução não apenas para o atual conflito, mas para a situação de opressão na qual vivem os palestinos desde 1948, essa passa, do ponto de vista político, com o apoio e ações que consolidem um mundo multipolar. Há de se ter uma mudança estrutural que, dentre outras coisas, exija uma recomposição do Conselho de Segurança da ONU e uma agenda que promova a cooperação entre os países do sul global que envolva tecnologia, comércio, energias renováveis, saúde, fortalecimento de Foros internacionais etc.
Do ponto de vista teológico, o fortalecimento de Instituições teológicas ao redor do planeta comprometidas com uma teologia dialogal e decolonial que enfrente o tema do genocídio, notadamente, o genocídio palestino em sua agenda; a ampliação de publicações de viés pastoral e comunitário que proponha um debate aberto sobre as teologias que dão sustentação e legitimidade às muitas violências e ao genocídio do povo palestino, em particular. A promoção de debates, fóruns, encontros com foco no povo das comunidades visando a ampliação do horizonte teológico com vistas ao mundo pacífico, justo e fraterno que espelhe o Reino de Deus.