Oração de Francisco de Assis transformada numa Canção Nova

Senhor,

Fazei-me um instrumento da vossa ira

Onde houver amor, que eu leve o ódio

Onde houver perdão, que eu leve a ofensa

Onde houver união, que eu leve a discórdia

Onde houver fé, que eu leve a dúvida

Onde houver verdade, que eu leve o erro

Onde houver esperança, que eu leve o desespero

Onde houver alegria, que eu leve a tristeza

Onde houver luz, que eu leve as trevas

Ó Mestre,

Fazei que eu procure mais agredir, que ser agredido

Perseguir, que ser perseguido

Odiar, que ser odiado

Pois é acumulando que se prospera

Vingando que se é vingado

E é matando que se vive para a vida segura

 

Francisco de Assis (1181-1226) foi tirado do catálogo por motivo de força maior. Na cultura de fortes investimentos, inovadores modos de produção e expectativas de vultosos rendimentos, há veneração de um só senhor: Mamom.

A ordem estabelecida obedece ao critério do lucro. O que passa disso é de procedência maligna. Mamom é uma entidade espiritual gulosa e ciumenta. Exige fidelidade.

No Brasil em que se cogita a formação da Bancada Cristã na Câmara dos Deputados, em caráter de urgência, para suposta defesa de VALORES, a figura icônica de Francisco de Assis está descartada.

A fundição das frentes Parlamentares Evangélica e Católica tem um mito para chamar de seu. Só a ele adorar, cultuar e servir.

Francisco de Assis representa imageticamente o sujeito simples da periferia que não sonega benquerença aos que vivem às margens. Se apegou com laços de amor e ternura às pessoas excêntricas (fora do centro). Sempre na esperança de vê-las transformadas pela força do amor.

Definitivamente, as igrejas cristãs no Brasil estão majoritariamente alinhadas com um projeto de sociedade que nega como modelo a figura frugal que prega a não-violência.

A ideia de fraternidade e espiritualidade assumida pelo Francisco de Assis, no seguimento a Jesus de Nazaré, parece démodé para boa parcela dos que frequentam cultos nas igrejas cristãs.

Nossas igrejas estão mais afeitas aos cânticos de guerra do que à Oração da Paz. Neste domingo (02) na Paróquia Santa Rosa de Lima, na Barra da Tijuca, o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), foi aplaudido de pé. Recebido como herói cinco dias após a megaoperação.

A megaoperação nos complexos do Alemão e da Penha, na Zona Norte do Rio, que deixou mais de 120 mortos na terça-feira (28), entre eles quatro policiais militares e civis, ganhou contornos de culto.

Enquanto a missa, conduzida pelo padre Marcelo Araujo, na Paróquia Santa Rosa de Lima, celebrou o dia da vingança em pleno Dia dos Finados.

Celebrações que evocam que o derramamento de sangue expia pecados.

A letalidade da ação planejada pelo governo do estado naturalizada pela liturgia carismática no Dia de Finados. Congregação que abençoa uns e amaldiçoa outros sem deixar desandar o ritmo da ladainha.

Por motivos óbvios, a Oração de São Francisco não faz parte dos roteiros de missas e cultos onde o governador Claudio Castro costuma cantar.

Valdemar Figueredo

Editor do Instituto Mosaico, professor universitário, pesquisador (pós-doc USP), cientista social e pastor

OPINIÃO
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