Os planos do partido ligado à Igreja Universal para as eleições municipais nas capitais
Tendo por base os dados levantados pela pesquisa em curso sobre as movimentações do Partido Republicanos em torno das eleições para prefeito nas capitais brasileiras, tangencio alguns argumentos.
Nesta coluna, dados compartilhados a partir das declarações do Republicanos quanto as suas estratégias para os pleitos municipais que ocorrerão em outubro. A meta é eleger 400 prefeitos e 3 mil vereadores no pleito de 2024.
Coligações
O Partido, controlado por quadros da Igreja Universal, participa de coligações para disputar as prefeituras das capitais tanto pelo cálculo político quanto pelas paixões religiosas.
O suprassumo da teologia da prosperidade no caldeirão do pragmatismo de mercado afeito ao Centrão no Congresso Nacional. Vigora o desvirtuamento ético do princípio “é dando que se recebe”.
Os evangélicos não deviriam subestimar pessoas que se movem pela ambição do poder em nome de Jesus e pela sua igreja, elas são perigosas. Com o agravante de as tais acreditarem que estão cumprindo mandatos divinos.
Pelo que foi verificado, esse parece ser o caso do deputado Marcos Pereira e da bancada que ele comanda. Utilizam imperativos divinos para justificar coligações sob o pretexto de uma guerra do bem contra o mal.
Em todas as capitais estudadas, o Republicanos sugere alinhamento em relação ao Partido Liberal (PL) e disputa hostil em relação ao Partido dos Trabalhadores (PT). O bem contra o mal ganha a sua versão estilizada de direita contra a esquerda.
A título de exemplo factual das inferências apresentadas, há o caso específico da disputa para a prefeitura em Vitória – ES. O atual prefeito, Lorenzo Pazolini (Republicanos), tenta a reeleição. Ele é ex-delegado de polícia e ex-deputado estadual (2019-2020). Como delegado, foi titular da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente.
No início da sua trajetória política, Pazolini encontrou no então senador Magno Malta (PL) um tipo de padrinho. Foi nesse contexto que se aproximou também da então assessora do Magno Malta, a hoje senadora, Damares Alves (Republicanos).
A dupla adoção política foi determinante para a visibilidade alcançada pelo delegado Pazolini. Estava em voga a CPI da Pedofilia, orquestrada pela dupla Magno Malta e Damares Alves. Na sua campanha em 2018 para deputado, Pazolini era visto frequentemente ao lado do Magno Malta em palanques, eventos e cultos nas igrejas evangélicas.
Tendo por suporte o material coletado sobre as eleições municipais nas 26 capitais em disputa, suponho que a candidatura do Pazolini não é atípica em relação ao Republicanos. Estamos perante certa regularidade de suposição de guerra do bem contra o mal, seja no culto de descarrego nos templos da Igreja Universal ou no ambiente do espaço público em que ocorre o sufrágio. Instigam para que o eleitor que ora, vote.
Nas capitais, o grupo do bispo Macedo está no bloco opositor aos candidatos lançados ou apoiados pelo PT. Únicas exceções: candidatura de João Campos (PSB), Recife – PE, em que a coligação abarca Republicanos e PT; candidatura do Evandro Leitão (PT), Fortaleza – CE, que recebeu o apoio do Republicanos, entre outras siglas; e a candidatura de Marcus Alexandre (MDB), Rio Branco – AC, que também construiu um arco de adesão partidária amplo que inclui Republicanos e PT.
Marcos Pereira: o braço direito do bispo Edir Macedo
O deputado Marcos Pereira (Republicanos – SP), presidente nacional do partido, vice-presidente da Câmara dos Deputados, principal articulador político da Igreja Universal, figura como um forte postulante à sucessão de Arthur Lira (PP-AL) na presidência da Câmara dos Deputados.
Muito que estamos assistindo nas eleições municipais de 2024 está relacionado a moedas de trocas para a composição da mesa diretora da Câmara Federal no início de 2025.
Segundo dados divulgados pelo deputado Marcos Pereira, em 2020 o Republicanos elegeu 216 prefeitos, 230 vice-prefeitos e 2.589 vereadores no Brasil. Para o pleito deste ano, a meta é eleger até 400 prefeitos e 3 mil vereadores. Ou seja, projeta um crescimento de 85% em relação às eleições de 2020.[1]
Para tornar mais objetivo o modo do deputado Marcos Pereira operar nos bastidores para viabilizar candidaturas no pleito municipal e para ampliar o poder da Igreja Universal, cito um segundo caso factual.
Ricardo Nunes (MDB). São Paulo – SP | O atual prefeito da capital paulista vai disputar a reeleição pelo MDB com apoio de amplo arco partidário, entre os quais, o Republicanos e o PL. Importante ressaltar que o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, que apoia a candidatura Nunes, é filiado ao Republicanos.
Entre outras figuras importantes do campo evangélico que endossam a candidatura do Ricardo Nunes, destaque para o empenho do deputado Marcos Pereira (Republicanos). Repercutindo a reunião que selou a aliança que determinou a coligação partidária, Marcos Pereira declarou:
Ontem à noite estive com o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes. Ao lado de líderes e representantes de diversos partidos, demonstramos nosso apoio à reeleição do prefeito. Nós, do Republicanos, sempre tivemos responsabilidade com a cidade, apoiando os projetos prioritários e destinando investimentos. E agora, no momento em que os valores que defendemos estão em jogo, vamos reforçar o nosso compromisso.[2]
Na linguagem adotada pelo deputado Marcos Pereira, a linha é tênue entre o líder que fala aos seus partidários políticos e aos seus correligionários religiosos, concomitantemente.
Plano de poder
A fala mansa do principal articulador político da Igreja Universal não esconde a volúpia para efetivar o Plano de Poder delineado por Edir Macedo.[3]
O modo aparentemente conciliador do Marcos Pereira não neutraliza a ambição primordial da cúpula da Igreja Universal: adquirir poder para dominar em nome de Deus.
Em disputa, dos conselhos tutelares, entidades de classe, conselhos regionais e nacionais de diversos categorias profissionais, passando pelas eleições para o legislativo e executivo (nas esferas municipal, estadual e federal), até o domínio das estruturas do Estado, em nome de Deus.
O plano de poder de um grupo religioso fica mascarado por um nome fantasia: Partido Republicanos.
Há aqueles que normalizam o plano de poder de uma igreja na República Federativa do Brasil. Gente que não quer ser considerada preconceituosa ou não pretende ser confundida como intolerante.
Convenhamos, tal projeto em curso liderado pelo Marcos Pereira, em nome de Deus, pelo Partido Republicanos e para a Igreja Universal, é anômalo em relação aos princípios mais rudimentares do estado laico.
Como se não bastasse, é estranho a tudo que Jesus ensinou. O projeto de poder da Igreja Universal é estranho ao projeto de serviço encarnado no Evangelho de Jesus.
Jesus estranhou o fato de que o debate entre os seus doze discípulos girava em torno de quem era o maior entre eles. Daí, pegou a bacia e começou a lavar os pés de cada um, para estranhamento geral. O mestre quebrou o silêncio: “Entre vós, eu sou o que serve!”
No Brasil, uma igreja apregoa desavergonhadamente o seu plano de poder. Abdica das bacias e constrói uma réplica do Templo de Salomão em toda a sua glória. Há quem diga que nessas estranhas catedrais está em desuso o que Jesus ensinou sobre o “lavar pés”, preferem o rito do “lavar mãos”.
Sempre oportuno distinguir o povo crédulo, sincero, que evangeliza como ato de amor ao próximo, humilde, tomado pela alegria espiritual e que busca na igreja o acolhimento, das cúpulas eclesiásticas insuladas que forjam planos de poder. Não se trata de desmerecer a fé de quem quer que seja, mas, por isso mesmo, apontar as contradições de uns poucos que se beneficiam da fé alheia.
[1] Republicanos quer ampliar número de prefeitos em até 85% nestas eleições. Marcos Pereira. Publicado no site oficial do Partido Republicanos em 08/08/2024. Disponível em: https://republicanos10.org.br/eleicoes-2024/republicanos-quer-ampliar-numero-de-prefeitos-em-ate-85-nestas-eleicoes/. Acesso em: 10/08/2024
[2] Marcos Pereira. Postagem no Instagram em 23 de abril de 2024. Disponível em: https://www.instagram.com/marcospereira1010/p/C6HQJqfR_Z2/. Acesso em: 14/08/2024.
[3] MACEDO, Bispo. Plano de poder: Deus, os cristãos e a política. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2008.