Quebrando a Banca do Comércio da Fé
Quem ia ao templo para adorar, precisava levar dinheiro para ofertar. Comerciantes em torno do templo vendendo elementos que seriam apropriados para agradar a Deus.
Numa breve consulta ao livro de Levítico, fica nítido que Deus poderia ser confundido com um senhor pançudo, guloso e extremamente detalhista, do tipo que joga o prato pra longe caso descobrisse um condimento a mais ou a menos.
O certo é que o comércio atua na identificação das demandas e na oferta de produtos. As barracas em torno do templo geralmente materializam a fé. Os barraqueiros da fé oferecem “porções divinas” devidamente embaladas.
Quando Maria e José foram ao templo em Jerusalém para apresentar o filho, eles não chegaram diante do sacerdote de mãos vazias. Um segurava a criancinha no colo e o outro carregava a oferta: um par de rolas ou dois pombinhos, conforme a lei previa no caso de famílias pobres.
O protocolo não se limitava ao que entregar. Por exemplo, a roupa do sacerdote, o turno do sacerdote, os espaços possíveis e os espaços vedados àquela gente comum no templo, tudo era devidamente estabelecido.
A ritualização do sagrado era ritmada. Chegar perto de Deus era para poucos e os muitos que tropeçavam nos pátios se contentavam em tocar nas vestes dos sacerdotes. Eles sim, os sacerdotes, podiam progredir para dentro das câmeras do templo e pisar lá perto de onde alegavam que Deus estava.
Grossas cortinas, degraus, pouca luz, porta estreita e nenhuma janela. Deus inacessível. Aquele mesmo das montanhas que fumegavam e ninguém subia. Medo, temor, tremor e distâncias.
O cerimonial religioso tão espetaculoso era para Deus vê e se agradar. Nas ruas, no entorno do templo, comidas, animais, condimentos, cozimentos, roupas, sensações, tudo disposto nas barracas e à venda, para o povão vê e comprar. O culto era uma oportunidade de lucro para uns e de compensações para outros.
Para cada motivo de culto as perguntas necessárias: Quanto vai custar? O que vai custar? Liturgias que tentavam ritmar as aproximações dos peregrinos do soberano Deus que habitava na câmara escura do templo em Jerusalém.
Daí, os discípulos de Jesus pedem para que ele ensinasse a orar. Antes de proferir a Oração do Pai Nosso uma recomendação: quando for orar, entra no teu quarto e de porta fechada, conversa com Deus.
Uma orientação tão simples teria o potencial de quebrar aquele mercado alimentado pelas brasas do culto. O templo é importante, mas Deus não habita em templos feitos pelas mãos dos homens. Os sacerdotes são necessários, mas não são os mediadores entre Deus e as pessoas. As ofertas têm o seu lugar na expressão de amor do fiel, mas não cumprem a função de bajular o divino a ponto de fazer o universo conspirar ao seu favor.
Interpretado literalmente, a oração intimista que não precisa se vestir com roupas especiais teria o potencial de levar a falência o comércio da fé. Pessoas despojadas, simples, em seus espaços, com suas linguagens, ao seu modo, falam com Deus assim: Pai…